Este site usa cookies para garantir que você obtenha a melhor experiência em nosso site. Política de Privacidade.

Notícia - Roteiros

Rota do Queijo: produtores rurais do interior de SP
A Rota do Queijo Artesanal oferece experiências rurais que vão além da degustação e ajudam a valorizar produtores independentes.

A Secretaria de Turismo e Viagens de São Paulo (Setur-SP) lançou no último dia 6 de outubro, o guia virtual da Rota Turística do Queijo Artesanal Paulista . Uma forma de trazer as melhores experiências para quem é fã deste produto milenar.

Além de provar uma grande variedade de queijos e visitar as lojinhas, os turistas podem conhecer o processo de produção, desde ordenha do leite nas vacas, até as cavernas de maturação dos queijos, entre muitas outras atrações que cada produtora oferece.

O guia dá detalhes das 37 propriedades rurais selecionadas, além de destacar seus produtores e municípios. “Mais do que aguçar o paladar, o turista pode viver as etapas de produção com intensidade. O queijo deixa de ser apenas um alimento para se tornar um artigo com história, com uma identidade original”, afirmou o secretário de Turismo e Viagens de SP, Roberto de Lucena, durante o evento Gabinete 3D do Governo de SP, que acorreu em Campos do Jordão .

A culinária típica do interior impulsiona o Turismo Rural , um dos segmentos mais procurados pelo viajante desde o início da pandemia, com crescimento de quase 30% ao ano, segundo pesquisa do Sebrae. O Turismo Rural tem levado desenvolvimento e sustentabilidade para o campo - e gerado renda para pequenos negócios familiares, segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT).

"Sou francês e já comi algumas toneladas de queijo ao longo da minha vida. Posso garantir que hoje não é preciso sair de São Paulo para experimentar os melhores queijos do mundo", disse Christophe Faraud, presidente da Associação Paulista do Queijo Artesanal, também durante o Gabinete 3D.

Boa parte dos produtores de queijos artesanais citados pelo guia também integram as dez rotas gastronômicas lançadas pelo Turismo do Estado de SP, ao lado de produtores de vinhos, azeites, entre outros produtos. A publicação é uma parceria da Setur-SP com a Associação Paulista do Queijo Artesanal e a Secretaria de Agricultura e Abastecimento de SP.

Para o Caminho do Queijo Artesanal Paulista, um grupo formado por pequenos produtores rurais do estado de São Paulo, a iniciativa tem uma grande importância, por trazer visibilidade aos produtores locais, que ficam “esquecidos”, quando se comparam aos produtores de outros estados, como Minas Gerais  — muito lembrada quando se trata de sua culinária, especialmente em relação ao famoso “Queijo Minas”.

“O turismo pode significar uma atividade econômica importante para o orçamento do pequeno produtor”, diz Mariane Takahashi, porta-voz da Caminho do Queijo Paulista, ao iG Turismo . “E ainda é uma forma interessante de aproximar o produtor do consumidor.”

Dessa forma, aponta Mariane, o consumidor passa a valorizar o queijo produzido artesanalmente, quando ele entende o que está por trás dessa produção, as pessoas que estão envolvidas, o espalho, o trabalho empenhado e que tudo isso reflete na qualidade, sabor e complexidade dos queijos.

Luzita Camargo, 60 anos, é produtora de queijos artesanais e proprietária da Cabanha Mulekinha, localizada em Ibiúna, interior de São Paulo. Ao iG Turismo , Luzita conta que a Rota do Queijo é muito importante para os produtores locais, especialmente para aqueles que ficam em áreas mais rurais.

“O produtor rural está distante das grandes cidades. Ele tem pouco acesso aos meios de comunicação. Falta até mesmo conhecimento para [o público] chegar até eles”, aponta Luzita.

“Então a Rota Turística do Queijo veio para tornar esse produtor visível para o Brasil todo, sem que ele faça grandes esforços para isso. O maior esforço que ele precisará fazer é produzir, e produzir com qualidade, para que o turista que chegar  buscando seu produto sinta que valeu a pena a viagem.”

Paulo Lemos, 41 anos, proprietário da queijaria Lano-Alto, localizada no distrito de Catuçaba, no topo da Serra do Mar , interior de São Paulo afirma que o principal benefício da Rota do Queijo é “colocar no mapa, de forma visível e tangível algo que a gente só consegue ver se for até os lugares.”

“Então a gente vê que em São Paulo tem queijo, se faz queijo e tem queijarias muito legais acontecendo. É muito legal de ver isso no mapa, mostrado ali. Antes isso era quase invisível, só aparecia para quem já estava no ambiente rural e que já conhecia uma queijaria ou outra. Era difícil ter um panorama, eu acho que essa Rota veio mesmo para colocar as queijarias no mapa e dar visibilidade para esse tipo de produção”, comenta Paulo ao iG Turismo .

Luzita complementa que o produtor ainda não necessita oferecer um ambiente luxuoso, mas sim acolhedor, que é o que as pessoas buscam. “Porque é um sítio, e as pessoas buscam esses produtos, elas não estão buscando luxo. Elas procuram um alimento puro, um alimento vivo. Eles compram a experiência, que é a história desse local e desse produtor.”

São Paulo como um grande produtor de queijos artesanais

Para Luzita, a “evolução queijeira paulista” começou há cerca de 20 anos, quando os primeiros produtores locais conseguiram um destaque, algo que a região de Minas Gerais sempre teve, em relação à produção queijeira.

“Porém, em São Paulo temos um grupo muito inovador, muito autoral”, afirma Luzita, dando destaque sobre a ancestralidade contida na produção que traz um toque diferencial para as receitas.

“Nós somos, em grande parte, descendentes de europeus — alemães, italianos, espanhóis, portugueses, franceses —, então a gente traz um pouco das nossas origens em nossas receitas, mas muito disso é um dom”, afirma Luzita.

Ela explica que, para produzir queijos autorais há inspiração nas receitas de fora (europeias, especialmente), mas não é possível reproduzir o mesmo produto que é feito no velho continente.

“Você não consegue reproduzir o mesmo produto usando leite de uma raça [de gado] diferente, em um clima diferente, aqui a pastagem que os animais comem é diferente. Então a gente pode se inspirar nesses queijos, mas eles sempre são autorais, porque eles têm toda essa diferença”, aponta.

“Na Lano-Alto, nós estamos a mil metros de altitude, e fazemos queijos autorais com leite de vacas do nosso próprio rebanho”, conta Paulo. “Nossos queijos maturados são todos de leite cru, algo difícil de se encontrar em São Paulo.”

O proprietário da Lano-Alto destaca ainda que a empresa foi a primeira queijaria registrada do estado a poder produzir queijo com leite cru. “Temos uma caverna de maturação que também foi a primeira a ser registrada, e fazemos, além dos queijos maturados, iogurtes, queijos frescos, e o requeijão de prato, que é um patrimônio cultural do nosso município, e uma espécie de 'avô do requeijão de copo', que hoje existe apenas industrializado.”

Queijos de Minas Gerais x queijos de São Paulo: Qual a diferença?

O toque autoral nas receitas dos queijos de São Paulo é algo que vem chamando muito a atenção de pessoas de todo o Brasil, até mesmo do mundo. A proprietária da Cabanha Mulekinha diz que não acha, necessariamente, que São Paulo seja melhor do que Minas Gerais, no entanto, para ela, os produtores paulistas têm um privilégio: o contato com o conhecimento e técnicas mais avançadas.

“Minas [Gerais] ficou muito no QMA [Queijo Minas Artesanal]. O que é, basicamente, uma receita única, partilhada entre os produtores”, explica Luzita. “Hoje, os produtores mineiros estão em um entrave, em relação ao mofo, que o IMA [Instituto Mineiro de Agropecuária] não quer liberar que eles maturem os queijos naturalmente, sem lavar a casca.”

Para ela, esse entrave é, de certo modo, uma vantagem para os produtores queijeiros de São Paulo, já que têm condições de oferecer uma variedade muito maior de possibilidades, o que ajuda a atrair o turismo.

“Quando um turista visita uma propriedade, ele não vai comprar um único queijo. Em cada queijaria ele encontrará de 10 a 20 tipos de queijo para degustar, conhecer e adquirir”, diz a empreendedora.

No entanto, ela reforça, apesar das dificuldades burocráticas, que o produtor mineiro não está estagnado. “Hoje já tem gente fazendo algo a mais, o que eles buscam agora é que o órgão responsável libere o uso do mofo. O que eles chamam que ‘queijo de casca florida’, que é quando o queijo vai maturando sem lavar a casca.”

“Mas eles não têm essa variedade comercial, por conta do sistema de controle que o Instituto Mineiro criou, querendo preservar a história da receita e da culinária original. Assim, eles se prenderam muito só nessa receita e ficou difícil para liberar algo diferente”, complementa Luzita.

Aberto para visitas

A Queijaria Mulekinha, parte da propriedade Cabanha Mulekinha, é aberta à visitação do público, que pode acompanhar o processo de produção dos queijos desde a ordenha das vacas.

“Nós recebemos visitação turística, pois nós já somos uma propriedade de turismo rural cadastrada na nossa prefeitura”, diz Luzita. “Nós atendemos aos finais de semana. Nossa queijaria tem um visor bem grande de vidro na frente, por onde o turista pode visualizar toda a nossa produção e nossos equipamentos”, ela complementa.

“Nossa propriedade é aberta para visitas aos sábados, e o visitante pode acompanhar a ordenha, que acontece às 16h. Podem ver os animais pequenos sendo amamentados em uma baia exclusiva. As pessoas também podem interagir com os animais e o visitante é livre para andar. Também temos a nossa loja, onde servimos degustação dos queijos que produzimos, entre outros produtos artesanais”, destaca.

Já Paulo aponta que sua queijaria não é aberta para visitação, mas oferece produtos únicos em suas lojas e eventos específicos de degustação comentada, na qual é exibido "detalhadamente o processo de produção". Ele destaca, ainda, que é possível se hospedar na fazenda, para quem deseja conhecer mais a fundo os processos de produção do local.

Turistas do Brasil e do mundo

Luzita conta que recebe visitas de muitos entusiastas, que procuram informações para se tornarem novos produtores de queijo. “Eles nos visitam para ver a estrutura necessária para se iniciar a produção e trocar ideias”, diz ela.

“Recebemos, também, muitos amantes de queijo, de vários lugares do Brasil, como Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul , e vem muita gente de fora do Brasil, como Japão Espanha Itália ... geralmente são pessoas que trabalham fora e vêm visitar parentes que residem em São Paulo e ficam curiosos para conhecer a nossa diversidade e comparar com os queijos que eles têm por lá.”

Receitas únicas e queijos mais populares entre o público

“Eu sou de origem espanhola, então eu faço dois queijos inspirados nas receitas da minha família na Galiza”, conta Luzita, mencionando que o primeiro queijo que produziu, Javier, acabou se tornando o favorito entre os seus clientes e visitantes.

Ela continua: “O primeiro queijo que eu fiz foi para consumo da família, eu nem tinha pretensão de ser queijeira. Eu o batizei como Queijo Javier, em homenagem ao meu tio. O nome original da receita não pode ser usado, por é um DOP [Denominação de Origem Protegida], de sua região de origem. Então eu fiz a minha versão da receita espanhola e esse primeiro queijo está sempre entre os mais vendidos. Nunca perdeu o reinado!”

“A gente tem três receitas que se destacam na preferência do público”, comenta Paulo. “O Queijo Causo, que é o nosso carro chefe, maturado por seis meses, feito com leite cru e mofo espontâneo da nossa região. É um queijo bem legal e ganhou o prêmio super ouro no Mundial do Queijo de 2022”, comenta o produtor.

Ele acrescenta: “Temos o Requeijão de Prato, que é muito tradicional e artesanal, e o nosso Doce de Leite, que também faz muito sucesso. Ele é um doce que se usa pouco açúcar e acrescentamos um pouco de sal, para não ficar muito doce. Nossos clientes e visitantes gostam bastante.”

A Queijaria Mulekinha conta com queijos já reconhecidos e premiados nas importantes premiações do ramo. “Graças a Deus a gente recebe esse retorno, pelo nosso empenho”, agradece Luzita.

“Em julho, no Prêmio Brasil, que foi em Blumenau (SC) , nós ganhamos prata pelo Javier e bronze no Montanha. Em agosto em Araxá (MG), que foi o mundial, nós ganhamos ouro no Araucária. Então a gente está super satisfeito por esse retorno, e, com certeza, isso traz mais pessoas interessadas em conhecer o nosso queijo. E público busca qualidade, e essas premiações confirmam o valor do produto que você tem. Isso é importante”, completa Luzita.

LEIA+
Autor: IG
Data: 01/01/2024